Finalmente temos uma data para mudar. Ela significa que, em três ou quatro dias, eu estarei ocupando corredores, cômodos e gavetas da minha futura-quase-definitiva-casa. Não empacotei praticamente nada ainda, porque só hoje recebi a confirmação das datas num email da companhia de mudanças. Eles chegarão num dia para encaixotar nossos pertences e desmontar os poucos móveis que compramos para essa casa; no dia seguinte o caminhão virá buscá-los. Estamos indo para um bairro um pouco mais afastado do centro, mas que nos oferecerá um pouco mais de espaço, garagens e privacidade.
Me parece estranho agora pensar que o último fim de semana que passei aqui ficou para trás sem que eu tivesse percebido. Fez um pouco de sol domingo passado. Ventou um bocado também, e por isso preferi não sair – eu e minhas eternas desculpas esfarrapadas para ficar em casa onde é seguro, não chove, tem coca cola + salame na geladeira e internet rápida. Ao invés de entrar na minha parka mágica e sair, tirei da garagem uma cadeira de lona (onde ela passou suas longas férias de inverno) e, pela primeira vez neste ano, pude sentar do lado de fora por alguns momentos. Joguei farelos de aveia para o casal de melros que está fazendo seu ninho nos galhos (ainda pelados, em abril) da árvore vizinha que se estende sobre o nosso quintal e observei as nuvens desfilando pelo céu surpreendentemente azul. É que eu desacostumei de olhar para o alto e ver qualquer outra cor além de variados tons de cinza – no naughty literary pun intended.
E me sinto agora da mesma maneira como me senti quando passei um ano na Alemanha; não creio que sentirei falta da casa em si, da cozinha pequena e desagradável, do jardim escuro e úmido, das janelas mal vedadas que transformavam os cômodos num freezer, do carpete vagabundo, da falta de espaço e organização. Nunca planejamos passar dois anos vivendo aqui; era para ser um lar temporário, mas as circunstâncias foram as que foram e aqui estamos ainda. Eu vou, no entanto, me lembrar deste lugar. Por mais alguns dias continuarei a dormir no quarto dos fundos como se nada acontecesse, com as cortinas abertas como sempre faço, sob a luz das janelas acesas no prédio vizinho, ouvindo o vento balançando as folhas das árvores e os esquilos brigando por comida na cerca do jardim; até o dia em que vou acordar e será hora de me juntar às pilhas de caixas que levarão dentro delas a pequena história contada aqui em 23 meses, entrar no carro e ir embora.



