A luz mudou, muitas árvores já quase nuas, os dias são curtos, o vento se sente mais frio e a chuva fina irritante aos poucos começa a fazer sua aparição diária. Fase de instrospecção e análise e remoção de excessos. As camadas de lã e algodão que uso para me proteger do clima já são pesadas demais; não preciso arrastar peso extra por dentro.
Não quero mais cultivar em mim o que eu mesma não entendo. O veneno desnecessário, as indiretas diretas, as tentativas de atingir quem está apenas levando a vida – de uma maneira talvez vagamente reprovável, mas que se não prejudica por que raios importa? Por que me manter voluntariamente ao redor de gente a quem tenho tantas críticas a fazer? Preguiça de dar unfollow, block, deletar o contato do telefone, tirar o nome da lista de cartões de natal? Medo de acabar sem ter ninguém para dar like no status, na foto de festa, no selfie inseguro, na curadoria de fragmentos tentando reafirmar que a vida é bela e por favor, concordem, porque aí sim talvez eu acredite?
Abrir as garras desse afeto interesseiro e deixar as pessoas irem. Se tudo o que conseguimos pensar quando pensamos nelas se resume a escárnio, então para o bem de todos (delas e nosso) talvez devêssemos considerar esquecê-las. Otimizar o banco de dados, deixar na mente apenas o que valer o espaço que ocupa. Vamos nos deixar ir. Nos despedir com um aceno de mão imaginário e a consideração que não foi bastante para que pudéssemos ser amigos mas que talvez seja suficiente para nos libertar do estorvo da insinceridade.