Colours from home.

Pequeno registro de dias divertidos que passei na casa do meu amigo R. em Angra dos Reis. Tinha um forró brabo rolando na praia e eu considerei seriamente a hipótese de me inserir naquele contexto; porém a minha companhia classy se recusou. Como também se recusou a me levar na “boate do Boboi” para curtir funk de atabaque + cerveja de latinha, vodka e WHISKY – tudo a um real. Não sei se agradeço ou se corto relações.

Por preguiça e medo de assalto levei uma câmera baratinha que só faz o requisito com bastante luz. E o tempo ficou permanentemente nublado e chuvoso, como (fiquei sabendo) é comum nessa região. Os ventos costumam ser tão fortes que ninguém usa “sombrinhas” como essas que a gente carrega na bolsa. Não, não, não – o povo sai pra rua com aqueles guarda-chuvas estilo BENGALA que eu pensava que só eram usados por idosos do sexo masculino. As sombrinhas comuns não servem porque são literalmente carregadas pelo vento. Várias pessoas tinham uma “bengala” LINDA, nas cores do arco-íris, que cobicei assim que vi. Em Angra (ou terá sido Paraty?) eu finalmente comprei uma delas, e fiquei toda pimpona – e depois vi que é claro que não ia caber na mala.

Mas sendo brasileira eu não sei desistir sem tentar. Fiz a mala assim mesmo – com a ponta do chapéu pra fora do zíper. O tio do despacho ameaçou fazer uma cena, mas o charme natural daquela que voz fala (erm, hahaha) acabou convencendo a deixar passar. Na europa isso talvez não colasse, mas há algumas vantagens para a necessidade que o brasileiro tem de ser simpático e agradar. E aqui estamos em plena europa com uma rainbow umbrella from Brazil.

Hey, England, I’ve brought you some colours from back home. Hope you like them. ♥

On the way out.

Minha estadia na wonderful city está chegando ao fim mais rápido do que o esperado.
Da última vez era inverno. Fiquei por três meses e foi com um coração pesado que fui embora, sentindo saudade antecipada das longas viagens solitárias de ônibus na companhia da minha seleção de mp3s e pensamentos. Dessa vez eu sinto que, se tivesse ido embora no primeiro dia, já teria ido tarde demais.

Ponho a culpa em uma combinação de calor (nota mental: NUNCA MAIS Brasil no verão), irritação com meus pais (nunca fui uma pessoa particularmente paciente e o pouco que tenho vem sendo testado todos os dias), dificuldade em me manter numa dieta baseada em proteínas num país obcecado por carboidratos, as decepções de sempre com pessoas, o absurdo dos preços, tédio. Dessa vez meu espírito aventureiro parece ter me abandonado. Não senti tanta vontade de entrar num ônibus só para saber o que há do outro lado da rota. Talvez porque, nas poucas vezes em que tentei isso recentemente, acabei suando em algum fim-de-mundo sem nada para fazer a não ser entrar no próximo ônibus de volta pra casa. O que seria OK caso estivesse frio. Mas com os termômetros quase na casa dos 40 eu perco a vontade de viver – imagine desbravar o mundo pela janelinha de um busão intermunicipal sem ar condicionado.

Eu estava animada para o natal e ele acabou se tornando outra decepção. Numa inocência que já nem combina mais com a minha idade eu esperava reviver os sentimentos de antecipação e encantamento da infância – mas como seria possível se esse apartamento pequeno, quente e barulhento sequer tem cara de lar? Me senti um periquito engaiolado ao invés de uma versão em miniatura de mim mesma decorando a árvore com luzes e bolinhas coloridas ouvindo A Harpa e a Cristandade – por acaso mencionei que essa casa nem tem mais aparelho de som e não posso ouvir música? Por acaso mencionei os mosquitos? Fui estúpida por não me dar conta de que meus natais de infância aconteceram numa época diferente, em casas diferentes e para uma pessoa diferente. Eu não sou mais aquela menina, essa não é mais a minha casa e o dia foi gasto consumindo vastas quantidades de comida e me sentindo levemente desconfortável. Escolhi passar o ano novo sozinha em casa porque não queria nem mesmo estar em família. Minha mãe foi para a igreja (nah), meu pai dormiu cedo, eu não quis me inserir no contexto familiar alheio e as opções de sair pra rua não me apeteceram.

Sei que vou soar ingrata, mas… uma vez que você saiu da casa dos seus pais, não deve voltar.

Passo boa parte do tempo assistindo aos canais do Telecine que, por alguma compensação cósmica, estão todos liberados no pacote barato da minha mãe. E rezando por chuva. Por uma tempestade daquelas épicas, em que o céu escurece às duas da tarde e os trovões acordam os deuses do seu estado de inexistência. Apesar de várias promessas e alguns ensaios, não vi nenhuma assim desde que cheguei e, bem, eu sinto falta. Do barulho que os pingos grossos fazem ao explodir contra o vidro das janelas, do cheiro que emerge da terra encharcada, do verde potencializado depois que a poeira dos dias escorreu das folhas, do ar que eu respiro mais limpo e dos céus se abrindo em luzes peroladas ou até mesmo num arco íris. Se alguém me perguntasse hoje quais são as coisas de que mais sinto saudades eu não citaria o “calor humano”, a cervejinha pós trabalho, a “família e os amigos” e nem mesmo o supervalorizado feijão. Eu responderia que sinto falta desses singelos alívios diários da tensão, como correr debaixo de uma tempestade tropical e admirar a topografia privilegiada do Rio de Janeiro com a mata atlântica se espalhando pelos morros.

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(dado o histórico da família da minha tia em relação a cuidados com animais de estimação ele provavelmente não vai estar por aqui muito tempo; mas foi legal ter conhecido o Prejuízo)

Sinto falta do silêncio. De não ter que suar. De ouvir música ao invés dos caminhões tropeçando no buraco da estrada em frente à janela. Sinto falta da comida (trust me). De lojas cheias de coisas que eu de fato tenha vontade de comprar ou admirar. Da minha cama, dos meus travesseiros, do quarto que eu decorei. Das minhas bonecas, de ter um jardim. Sinto falta da minha vida e a quero de volta – a vida que eu posso ter agora, e não a que eu escolhi deixar para trás há sete anos, com todos os seus riscos e possibilidades. Ela podia ter sido triste, ela podia ter sido linda. Hoje ela não pode ser mais nada – porque simplesmente não foi. Eu segui por outro caminho e essa outra vida, a que eu não escolhi, já não é mais possível. Ela também não me escolheu e anda me lembrando disso aos gritos, todos os dias desde que cheguei. E então eu decidi ouvir.

Não estou triste. Estou apenas reflexiva. Talvez até esperançosa.

Não vou “ficar para o carnaval”, como previamente planejado. Não preciso de mais de uma decepção para descobrir que o carnaval possível não vai chegar aos pés dos carnavais de antes onde, fugindo do samba, eu entrava numa kombi com outros 10 adolescentes para cruzar a ponte Rio-Niterói e passar cinco dias brincando de casinha num barraco perto da praia na região dos Lagos. Mas essa época, essas pessoas, aquela menina não existem mais. Those days are gone. I should let them go.

Estarei voando de volta para o frio em breve.
A vida que eu quis me espera, e a que eu não quis não me esperou. Acho justo.

Beijo.

Beijo pra quem gastou 50 pilas em esmaltinho no Mercadão de Madureira hoje, AEAEAEAEAEAE
Beijo pra quem está doida pra testar esmalte novo mas com a unha cheia de glitter e preguiça de tirar.

Vamos começar a narrativa do dia comentando os SETENTA E CINCO minutos (uma hora e quinze) em que fiquei no ponto aguardando um ônibus. Quem manda apostar na redenção de uma companhia de ônibus que só faz se afundar cada vez mais na própria falta de vergonha e de respeito pelo usuários – incluindo forçar outra companhia de ônibus a REMOVER uma rota porque isso estava ameaçando o seu monopólio.

Enfim, papo chato.

Só sei que aguentei a espera motivada unica e exclusivamente pela raiva e pela vontade de dizer poucas e boas para o motorista. Quando o ônibus finalmente chegou, segundos antes de eu desistir e pagar mais caro pegando outro ônibus, é EVIDENTE que estava lotado. Escorreguei por entre o suor alheio para conseguir 15 centímetros quadrados de chão para pisar e comecei a passar mal quase que instantaneamente por causa do calor. E do ar rarefeito porque, convenhamos, era nariz demais ali para pouco oxigênio.

As pessoas queriam impedir o motorista de parar nos pontos seguintes, mas é claro que ele não podia fazer isso. Essa parte eu aceitei e entendi – afinal, se eu estava esperando todo aquele tempo, outras pessoas também estavam e mereciam a opção de entrar na lata de sardinha caso necessitassem. O que eu não entendi e muito menos aceitei: o motorista bancando o INGRASSADO e sendo grosseiro sem necessidade. “Por que todo mundo quer usar essa linha? Porque é mais barata? Paguem mais caro pelo outro ônibus, oras! Tem até ar condicionado! Se optar por pegar esse, não reclama do atraso!!”.

Ouvir isso é melhor apenas do que ser surda. Marginalmente. Ou não; ser surda talvez fosse melhor. A única coisa pior do que ouvir isso naquele momento seria ser surda, cega, muda, ter um poste de eletricidade enrolado com arame farpado e piche enfiado no cu e ter que viajar em um ônibus da União. Ou melhor, só viajar num ônibus da União já é pior do que tudo isso junto. Tive que me manifestar.

– Por que todo mundo quer pegar essa linha mais barata? Porque a diferença no preço não vai sair do SEU bolso?? Porque tem gente aqui que recebe vale transporte que não cobre a passagem do OUTRO ônibus? E porque vai fazer diferença no fim do mês pra quem ganha salário mínimo? E já pensou que se todo mundo resolver pegar o OUTRO ônibus a União vai à falência e você vai pra rua? E aí? Vai pegar ônibus mais caro com o auxílio desemprego?

Não sei de onde saiu essa eloquência. Provavelmente da revolta. Só sei que baixou um silêncio sepulcral no ônibus (nada da salva de palmas que eu estava esperando), o que só serviu pra fazer eco com a resposta do motorista, um murmúrio nos moldes de “a culpa não é minha”. Pelo ATRASO não, mas por fazer piada sapateando em cima do sofrimento de gente pobre a culpa é toda sua, fio.

Desci no ponto já puta, desidratada, com a boca seca e trocando as pernas. Foi difícil achar a agência dos correios – na verdade foi difícil chegar até lá, tentando me equilibrar e me desviar das pessoas passeando à minha frente. Teoria: pessoas que habitam lugares pobres andam muito devagar. O que não é inteiramente compreensível, já que esses lugares costumam ser pouco pitorescos para um passeio. Quando por fim cheguei nos correios (onde, para o meu desespero, lembrei de que precisava subir escadas) tinha uma fila e eu quase desfaleci. Lugar pra sentar? Ar condicionado? Ventilador? Tudo supérfluo. Chegou a minha vez, postei as encomendas (FOTOGRAFEI tudo para guardar como prova do crime caso não cheguem ao destino), e tive coragem de entrar em OUTRO ônibus (que também demorou a chegar e a sair – mas será o Benedito?) para me enfiar no Mercadão de Madureira atrás de ESMALTE.

Eu merecia um longo banho de banheira hoje.
Mas não tem banheira.